segunda-feira, agosto 31, 2009

CRISE DE SIGNIFICADO

“Eu sou o caminho, a verdade e a vida”. (João14: 1-14)



A vida tem um sentido.
Tanto no mundo físico, como no universo psico-emocional há forças atuantes e estruturantes da ordem e das interligações complexas entre fatos e fenômenos.
Caos e a desordem são apenas sub-fenômenos passageiros e limitados, necessários para a subseqüente ordem e sentido.
Mas se entre os físicos ainda se dá tom polêmico a tais digressões, há um consenso entre os estudiosos humanistas de que vivemos uma época de falta de sentido.
O sentido aqui não se refere apenas a direção, mas sobretudo a significado.
É verdade que muitos andam sem um senso de direção, entregues às variações circunstanciais de cada dia, mas quase todos estão sem foco de significado.
Digo significado no micro e no macro, no material e no espiritual.
Pequenos momentos importantes estão sendo tragados pela pressa do cotidiano ou distorcidos em sua essência. As tradições decaem. Não há contemplação, sentir, na acepção mais pura de sua etimologia. Pelo contrário, vivemos um processo de dessacralização, de massificação de vivências, de padronização de comportamentos.
E se as pequenas coisas se tornaram apenas coisas pequenas, não é diferente – pior quiçá – numa dimensão maior, de significação à própria vida.
Vê-se, como nunca, crescerem propostas e condutas que atentam contra a dignidade da vida: aborto, eutanásia, suicídio, pena de morte, torturas.
No campo pessoal, simplesmente isto não está em pauta. As pessoas fazem planos financeiros, patrimoniais, de carreira, de viagens, mas não refletem sobre o destino de suas vidas, pois não buscam resposta a uma das questões cardeais de nossa existência: qual significado quero dar à minha vida?
O resultado desta falta de foco tem repercutido a partir de certa idade, muitas vezes quando as metas materiais foram atingidas. De que adiantou tudo que fiz, tudo que conquistei se não consigo estar feliz, se não tenho mais vontade de fazer nada, nem de viver? Muitos se perguntam na refrega da dor.
Para a plenitude da alma o bem-estar não substitui o bem.
O psiquiatra Viktor Franklin criou a logoterapia ou terapia do sentido ao observar que certas doenças são resultado tão-somente da falta de sentido na vida, constatação esta também do pai da psicanálise Carl Jung.
Nas últimas décadas a situação piorou. Os filósofos debatem ardentemente sobre o mal-estar da sociedade pós-moderna. Os consultórios de terapia estão cheios, as clínicas psiquiátricas lotadas, nunca a indústria farmacêutica lucrou tanto com remédios controlados, especialmente os que bloqueiam as emoções, afetam o humor e a sensação de bem-estar. Não é à-toa que as drogas lícitas e ilícitas ganham cada vez mais simpatizantes e adeptos em um mundo onde a falta de sentido provoca um vazio existencial que só tem sido amenizado, numa lógica do absurdo, pelo entorpecimento do espírito.
Muitos procuram esse preenchimento na religião. Chegam angustiados, infelizes, vazios e procuram um Deus que os poupe da dor, que possa fazer o que desejam, mas sem esforço. Há também aqueles que querem comprar bênçãos, como se estivessem num shopping do sagrado e, obviamente, há muitos prontos para venderem qualquer coisa.
Neste pico histórico do materialismo, as pessoas não buscam significado, mas resultados.
Sem um significado maior, de resultado em resultado a vida vai perdendo o sentido.
Não é o carro do ano, a viagem a Paris ou o casamento que vai tornar a pessoa plena. Tudo isto deve ser etapa de algo maior, que transcenda a efemeridade.
É sempre bom se perguntar: isto é realmente importante para minha vida? Posso transformar isso em algo útil? Qual o legado que deixarei quando chegar ao fim minha caminhada na matéria?
Nada, algo que será esquecido rapidamente ou um tesouro imperecível?
Se tivesses no final da linha e olhasses para trás, o que verias? O que mudarias? Quais teus recomeços?
Sempre é possível o recomeço. Não de recomeço-tempo, mas tão-somente de recomeço-processo. Ou seja, não se pode voltar e desfazer o passado e suas causas, mas é possível refazer o futuro e seus efeitos.
Jesus promoveu e ainda promove muitos recomeços através de um toque essencial de significado a vidas vazias, perturbadas, enfermas, desorientadas, que o digam São Pedro, Maria de Magdala, São Francisco de Assis e São Paulo, apenas para citar alguns exemplos.
Nestes tempos de falta de sentido, ecoa forte o convite do mestre: vinde a mim todos vós que estais sobrecarregados.