O
capítulo 3 de meu livro A Grande
Transição da Terra: o sentido de urgência trata da dinâmica do sistema.
Dentre as observações que faço, destaco que sempre que uma contestação ao
sistema ganha força, surge a reação. Entre as formas mais comuns de reação está
a desqualificação de fatos, estudos e a implantação de dúvida.
É exatamente o que está
acontecendo com as mudanças climáticas. Tenho visto pessoas instruídas com
dúvidas sobre fatos óbvios, concretos, comprovados. Esse é um indicativo de que
a reação do sistema está tendo êxito.
Dúvida – quase sempre bem-vinda –
no tocante às transformações climáticas é péssima, porque gera mais desconfiança,
indiferença e atraso nas mudanças que precisamos fazer.
Quem já leu o Capítulo 2 de meu
livro, entende o sentido de urgência ao qual me refiro no subtítulo da obra.
Quem ganha com esta letargia epidêmica?
O silêncio dos candidatos à
presidência dos EUA sobre o aquecimento global e aspectos importantes das
mudanças climáticas demonstram sinais claros de retrocesso na condução do
assunto.
Agora, o silêncio foi pelos ares
com ventos de mais de 150 km/hora de Sandy, que começou como um furacão dos
mais fracos e ainda assim foi espalhando um rastro de destruição pelos países
da América Central, inclusive no Haiti, que foi novamente arrasado.
Quando
Sandy tocou o solo americano, já nem era furacão, mas – apesar da perda de
força – é considerada uma tempestade extratropical sem precedentes no Atlântico
Norte com cerca de 1600 quilômetros de diâmetro, que fez o mar subir surrando as edificações na zona costeira, que continua
sendo ocupada desordenadamente em todo mundo, inclusive no Brasil.
A fúria do mar está provocando ruínas,
enchentes e incêndios em várias partes da costa americana. E vejam só, a
história se repete: a usina nuclear mais antiga do EUA está no alerta máximo
por causa do avanço do mar. E ainda há quem defenda essa perigosíssima fonte de
energia.
Já nas primeiras horas em solo
americano faltavam alimentos, combustíveis, energia e transportes, todos
paralisados, inclusive o aéreo, que afetou todo planeta. Cidades gigantescas e
muito povoadas estão desertas. Hospitais tiveram de ser esvaziados no meio da
tormenta, enquanto milhares de pedidos de ajuda não foram ouvidos porque as linhas
telefônicas de emergência rapidamente ficaram sobrecarregadas. E, não
esqueçamos, estamos falando do país mais poderoso do planeta.
Na maior potência econômica e
financeira do mundo, a Bolsa de Valores – paralisada - está se rendendo às
forças da natureza. A primeira estimativa de prejuízos com esta única
tempestade só nos EUA é de 20 bilhões de dólares e deve subir.
Muitos analistas que moram em
Nova York afirmam categoricamente que Sandy está tendo um impacto muito maior na
cidade do que o ataque terrorista de 11 de setembro. Estamos em guerra, alguns
vaticinam.
Guerra contra quem? Contra a
natureza? Temos chances?
Sandy, neste momento, é apenas
um evento que gera experiências de terceiro grau (vide Capítulo 7, de meu
livro). Está muito longe de ser um exemplo da força máxima de um evento cataclísmico.
Imaginemos, então, eventos que causam as experiências de quarto e quinto grau?
Convém, nessa senda, não olhar
apenas a bola, mas sim o jogo. Sandy é apenas uma pequena peça de um tabuleiro
maior, cujos eventos se somam diante de nossa inclemente indiferença. Vejamos:
estamos presenciando o aumento de temperatura em várias partes do planeta
(setembro último foi o segundo mês mais quente da história, desde que começaram
as medições de temperaturas). Estamos
presenciando degelo acelerado no Ártico (mais rápido que a maioria das pesquisas
previu) que atingiu seu menor nível histórico e secas recordes em todo mundo, inclusive no Brasil, que novamente
enfrenta um salto no aumento do desmatamento da Amazônia, reflexo, entre outras
coisas, de retrocessos legais como os que ocorreram no novo Código Florestal. A
crise alimentar segue se espalhando, enquanto batemos recordes de emissão de CO²
na atmosfera.
Os dados se acumulam, os eventos
se somam, enquanto o tempo se escoa.
Não estamos condenados a uma
transição planetária caótica e apocalíptica. Não, definitivamente não. Mas
somos atores neste palco. Nossa omissão tem um preço. E ele está sendo
faturado. A conta pode chegar a qualquer momento e todos teremos de pagá-la.
Alguns incautos dirão: exagero!
Eventos de grande destruição como o Sandy não fazem parte da realidade do
Brasil e da maior parte do planeta. Não custa lembrar que a Europa nunca tinha
sido atingida por um furacão até 2005, quando o furacão Vince a atingiu ferozmente.
Da mesma forma, no mesmo ano de 2005, o furacão Catarina mudou a teoria sobre
furacões – até então considerados impossíveis no Atlântico Sul – quando arrasou
Santa Catarina, pega de surpresa com um evento destruidor daquela dimensão.
Ah sim! Provavelmente dirão que é
o acaso...
Não é.
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