É
hora do almoço. Centenas de funcionários da Vale estão reunidos no refeitório.
Próximo dali outras centenas de pessoas vivem mais um dia aparentemente normal
em suas comunidades. Mas, pouco depois de meio dia, a Barragem do Córrego do
Feijão em Brumadinho/MG rompe e um rio de resíduos da mineração desce a mais de
100 km/h destruindo tudo que está em seu caminho.
Segundos
depois, centenas de pessoas que seguiam suas rotinas estão soterradas e o
ecossistema do entorno destruído. Nos dias que se seguem, surgem histórias
incríveis de sobreviventes que não conseguem entender como se salvaram.
Neste
momento que escrevo, ainda estou muito triste com essa tragédia colossal e esse
é o sentimento geral do povo brasileiro. Ela suscita algumas perguntas
importantes: o desastre tinha de acontecer? Existe carma coletivo?
Primeiramente
é preciso ter muito cuidado ao tratar do tema. Sem dúvida que resgates relativos
a carmas coletivos existem, mas generalizações como as que afirmam que todos
estão pagando por erros do passado podem mais machucar do que esclarecer. É,
pois, indispensável ter respeito pelas vítimas e pelo sentimento de familiares e
amigos.
O
resgate de dívidas cármicas do passado não ocorre apenas através de carmas
coletivos. Dá-se a todo momento e de forma individual principalmente. A quase
totalidade de pessoas encarnadas neste planeta está aqui porque precisa evoluir
muito, o que inclui a necessidade de resgatar carmas em um processo complexo de
aprendizagem espiritual. Portanto, estamos a cada momento recebendo efeitos de
ações praticadas outrora.
Ou
seja, a morte em um evento cataclísmico não quer dizer necessariamente que
aquela pessoa cometeu crimes em vidas passadas em associação com as demais
vítimas. Embora possa haver laços entre algumas vítimas, outras podem ser
alcançadas por carmas individuais, sem nenhuma relação com atuação coletiva no
passado.
Em qualquer caso, o carma não deve ser visto
como uma punição a um “pecador”. O resgate é apenas o efeito materializado de
uma causa, próxima ou distante, que está relacionada ao exercício do livre arbítrio
da pessoa, que mais do que vítima, é um Espírito eterno em processo de
aprendizagem.
Por
outro lado, convém ter cautela em afirmações. A maioria das pessoas que afirma
que este ou aquele evento com muitas vítimas é um carma coletivo está apenas
especulando. De regra, não temos como saber. Eventualmente a espiritualidade superior
se manifesta conclusivamente indicando fatos específicos como carmas coletivos.
Então, por prudência e por honestidade, devemos deixar claro quando temos
absoluta certeza de algo e quando estamos especulando a partir de conhecimentos
gerais da doutrina espírita.
Por
fim, o desastre não deve ser tratado nem como fatalidade e nem como acidente.
Não
se trata de uma fatalidade. Ou seja, não é algo que está determinado
previamente. Não estamos diante de um fato que deveria ser exatamente assim
como foi. Admitir isso, seria negar o nosso livre arbítrio e a responsabilidade
pessoal que temos, inclusive quando faz parte de nosso trabalho garantir a
segurança de outras pessoas.
Tornou-se
comum ouvir espíritas explicando tudo com o clichê: nada acontece por acaso[1]. A
afirmação parece abranger tudo, como se o Espiritismo ensinasse um fatalismo
determinista. Não ensina. A lei de causa e efeito é bem mais complexa do que
parece.
Com
os cuidados adequados a maioria dos desastres podem ser evitados e, mesmo
quando for inevitável, o número de vítimas e os danos ambientais podem ser
minimizados.
A justiça divina sempre encontrará meios de resgates
de dívidas cármicas, independente do auxílio de nossa negligência, ambição e
indiferença.
Cabe
a cada um de nós, cidadãos, sociedade, empresas e Estado fazermos todo esforço
possível para que tragédias como essa não voltem a acontecer e que o
desenvolvimento sustentável não seja apenas um ideal abstrato, pois só assim
todos evoluímos enquanto indivíduos, sociedade e planeta.
[1]
Aqui no blog, a amiga leitora (or) encontra um artigo sobre o acaso explicando
nuances dessa frase.
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