sábado, março 29, 2008

MAIS DO QUE PÓ

“Vós sois deuses”
(Jesus)


Jesus em muitos momentos estabeleceu revolucionárias rupturas nos conceitos vigentes à sua época. Dúvida não resiste, que dentre as principais, a afirmação do Mestre de que nós somos “deuses” impactou o imaginário coletivo, chocando-o, haja vista que os ouvidos que receberam a mensagem do Cristo eram, sobretudo, de judeus oprimidos por Roma, de pobres maltrapilhas, trabalhadores simples, de párias da sociedade, de enfermos moribundos e pessoas de “má vida”.
Como admitir, no exercício do absurdo, que aqueles que viviam à margem da sociedade eram deuses?
Poucos, além dos iniciados, compreenderam a profundidade e extensão da fala do Cristo. Ele se reportava aos potenciais do espírito humano. Ao que podemos ser e, a partir daí, do que podemos sentir e fazer. Espírito de escol, provindo de elevada região de luz, o Mestre se sensibilizava com nossa miséria espiritual, a verdadeira pobreza que sela os mendigos da alma, quase sempre embebidos pela ilusão da matéria e que tanto se comprazem nas pequenas e grandes maldades, nos tolos conflitos, nas covardes opressões, na vã vaidade, nos ciúmes, na inveja, nas rivalidades, nas traições e mentiras, entre tantas torpezas que ainda alimentam as almas apequenadas.
“Vós sois deuses” quer dizer que por debaixo das camadas trevosas de nosso egoísmo e orgulho há um infinito universo de luz a ser explorado, potenciais a serem desenvolvidos, capacidades a serem descobertas, talentos e dons a serem libertados, felicidade plena a ser vivenciada em Oasis de paz. Lamentavelmente, o formato das religiões tradicionais apenas acessa esse universo com limitadas lunetas e o materialismo se encarrega de sobrepor mais camadas de ilusão, embaçando nossa visão e retendo-nos nessa vida superficial e ilusória dos sentidos.
Toda vida é significado.
Viver sem o sentido sagrado é não viver, é desprezar a abençoada oportunidade de se tornar um ser divinizado. É, em última instância, restringir-se a pó, tal como ensina a mensagem[1] Em Plena Era Nova de Eurípedes Barsanulfo, in verbis:
“Há criaturas que deixaram, na Terra, como único rastro da vida robusta que usufruíram na carne, o mausoléu esquecido num canto ermo de cemitério.
Nenhuma lembrança útil.
Nenhuma reminiscência em bases de fraternidade.
Nenhum ato que lhes recorde atitudes como padrões de fé.
Nenhum exemplo edificante nos currículos da existência.
Nenhuma idéia que vencesse a barreira da mediocridade.
Nenhum gesto de amor que lhes granjeasse sobre o nome o orvalho da gratidão.
A terra conservou-lhes, à força, apenas o cadáver – retalho de matéria gasta que lhes vestira o espírito e que passa a ajudar, sem querer, no adubo às ervas bravas.
Usaram os empréstimos do Pai Magnânimo exclusivamente para si mesmos, olvidando estendê-los aos companheiros de evolução e ignorando que a verdadeira alegria não vive isolada numa só alma, pois que somente viceja com reciprocidade de vibrações entre vários grupos de seres amigos.
Espíritas, muitos de nós já vivemos assim!
Entretanto, agora, os tempos são outros e as responsabilidades surgem maiores.
O Espiritismo, a rasgar-nos nas mentes acanhadas e entorpecidas largos horizontes de ideal superior, nos impele para frente, rumo aos Cimos da Perfectibilidade.
A Humanidade ativa e necessitada, a construir seu porvir de triunfos, nos conclama ao trabalho.
O espírito é um monumento vivo de Deus – o Criador Amorável. Honremos a nossa origem divina, criando o bem como chuva de bênçãos ao longo de nossas próprias pegadas.
Irmãos, sede os vencedores da rotina escravizante.
Em cada dia renasce a luz de uma nova vida e com a morte somente morrem as ilusões.
O espírito deve ser conhecido por suas obras.
É necessário viver e servir.
É necessário viver, meus irmãos, e ser mais do que pó!”




[1] XAVIER, Chico. VIEIRA, Waldo. O Espírito da Verdade, Editora FEB, 15ª edição, Brasília, pg. 38,39.