domingo, novembro 09, 2014

A OMISSÃO DOS ESPÍRITAS - PARTE I




“Temei conservar-vos  indiferentes, quando puderdes ser úteis.”
(O Evangelho Segundo o Espiritismo, cap. XIII, item 17)



Penso que uma das maiores demonstrações de amor é ofertar uma crítica sadia, construtiva, com intenção de propor uma reflexão sobre o aperfeiçoamento de determinada atitude.
Essa é a minha intenção com este artigo: propor uma reflexão e estimular uma mudança de postura do movimento espírita.
Como se sabe, as eleições de 2014 entram para história do Brasil não apenas como as mais acirradas, mas, sobretudo, serão lembradas pela virulenta hostilidade, pela indigência ética, pelo debate superficial de temas de relevância nacional e pela explosão do preconceito e do fundamentalismo.
Este cenário deveria ter mobilizado a atenção e manifestação do movimento espírita.
Contudo, salvo pontuais exceções, o movimento espírita silenciou, optou pela omissão diante do contexto e dos fatos supracitados.
O Censo 2010 sobre as religiões seguidas pelos brasileiros realizado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) indica que os espíritas já beiram os 4 milhões de brasileiros, isto sem contar os milhões de simpatizantes. Entre 2000 e 2010, os seguidores da doutrina espírita aumentaram 65%. Trata-se de aumento considerável. Comparativamente com outras crenças, os espíritas possuem as maiores proporções de pessoas com nível superior completo (31,5%) e taxa de alfabetização (98,6%), além das menores percentagens de indivíduos sem instrução (1,8%) e com ensino fundamental incompleto (15,0%).
Da pesquisa do IBGE, nota-se, claramente, que os espíritas somam um número relevante de eleitores, têm boa instrução educacional e são potencialmente formadores de opinião.
Para além de o Espiritismo nos ensinar uma fé racional e propor a reforma íntima como centro de suas atenções, historicamente os espíritas são tidos como moderados, conciliadores e tolerantes, até porque foram por longas décadas as principais vítimas de perseguição e discriminação religiosa.
Ou seja, os espíritas e o movimento espírita reúnem uma combinação de experiências, características e virtudes que podem agregar conteúdo e propostas ao debate político.
Não obstante isso, o tema política no movimento espírita segue – em pleno terceiro milênio - como um insustentável tabu e, nesta condição, impede debates e reflexões maduras sobre o assunto, que acaba invariavelmente apequenado, reduzido a posições inflexíveis e arquivado na prateleira dos assuntos proibidos.
Desejo, neste despretensioso artigo, praticar a heresia de enfrentar este tabu, certo de que nenhum confrade vai acusar-me de má-fé, de obsediado ou condenar-me ao umbral.
Preliminarmente, anoto a sequência de minhas considerações. Quero primeiro explicar porque Kardec evitou tratar mais a miúde de política. Depois esclarecer o que devemos evitar em política. Terceiro, explicitar qual minha visão sobre a importância de um posicionamento sóbrio e maduro dos espíritas e do movimento espírita sobre política. Por fim, encerrarei este artigo rascunhando um esboço superficial, imperfeito e incompleto de alguns temas sobre os quais deveríamos nos posicionar.
Iniciemos com a posição de Kardec.
Emmanuel, através de Chico Xavier, no seu livro A Caminho da Luz, chama atenção ao fato de que Kardec reencarna em 1804, poucos anos depois da queda da Bastilha e da Declaração de Direitos do Homem e do Cidadão e apenas dois meses antes de Napoleão sagrar-se imperador[1].
O mundo entrava em um período de profundas renovações políticas, filosóficas e jurídicas, mas também de guerras.
Quando Kardec compilou a codificação espírita a humanidade experimentava a onda de razão do Iluminismo, que dentre outras coisas separou o Estado da religião, até então instituição central na vida política das sociedades.
Considerando os abusos que a religião promovera na condução de assuntos políticos[2], o Estado laico revelou-se uma das grandes conquistas da evolução política.
Naquele contexto, era totalmente razoável Kardec querer distância da política.
Acertadamente, sua prioridade foi focar sua pesquisa no desvelar do mundo espiritual, suas leis e organizar suas descobertas de forma a fomentar uma espiritualidade racional e que tivesse por escopo a reforma íntima.
Contudo, a conduta de Kardec não deve ser interpretada como uma posição de refutação ou desvalorização à política. A percepção mais adequada é de que ele – com sua arguta inteligência – percebeu a sensibilidade daquele momento histórico marcado pela força do Iluminismo e, sobretudo, tinha por alvo prioritário a questão espiritual.
Não obstante isso, Allan Kardec não foi omisso.
O livro Obras Póstumas, no capítulo das “Aristocracias”, consigna um estudo sobre os problemas e desafios religiosos, econômicos, sociais, culturais e políticos da humanidade.
Kardec respeitando a proposta Iluminista e aditando-a com sua visão espiritualizada, apresenta sua previsão sobre o advento da futura aristocracia intelecto-moral, no qual vislumbra um novo modelo de política, conduzida por lideranças que detenham não apenas preparo intelectual, mas também sólidas virtudes éticas e morais, que pudessem conduzir a humanidade nos complexos desafios da transição planetária.
Portanto, a distância asséptica que o Espiritismo mantém atualmente da política parece-me um equívoco, que precisa ser amplamente debatido e revisto urgentemente.
Feito este esclarecimento histórico, impõe-se passar para o segundo ponto, que é esclarecer o que devemos evitar em política.
A atuação política que defendo não é a de um projeto de poder, como defendem e fazem outras religiões.
Portanto, não defendo que os espíritas fundem um partido político, nem se filiem a um (embora possam fazê-lo no exercício de sua cidadania) e tampouco que o movimento espírita lance candidatos oficiais para os cargos eletivos para falarem em nome do Espiritismo e do movimento espírita.
Em verdade, não deve o espírita se preocupar em ocupar cargos estratégicos no Estado – embora possa fazê-lo cônscio de suas responsabilidades - ou desrespeitar a configuração constitucional do Estado laico.
Sobre estes aspectos, o livro O Consolador, de Emmanuel, recebido pela psicografia de Chico Xavier nos traz importante anotação[3]:

“O espiritista sincero deve  compreender que a iluminação de uma consciência é como se fora a iluminação de um mundo, salientando-se que a tarefa do Evangelho, junto às almas encarnadas na Terra, é a mais importante de todas, visto constituir uma realização definitiva e real. A missão da doutrina é consolar e instrui, em Jesus, para que todos mobilizem as suas possibilidades divinas no caminho da vida. Trocá-la por um lugar no banquete dos Estados é inverter o valor dos ensinos, porque todas as organizações humanas são passageiras em face da necessidade de renovação de todas as fórmulas do homem na lei do progresso universal, depreendendo-se daí que a verdadeira construção da felicidade geral só será efetiva com bases legítimas no espírito da criatura.”

Também não defendo que o movimento espírita se posicione a favor deste ou aquele candidato, grupo político e que muito menos suba em palanques. A questão não deve ser tratada sob a ótica de ideologias políticas ou de política partidária.
Não, não é isso que defendo.
O que defendo é o debate, sob a ótica espírita, de temas centrais à humanidade e o pertinente posicionamento político lato sensu do movimento espírita a respeito de tais temas.
Este é o terceiro ponto.
Consignado o respeito a quem pensa diferente, mas entendo que é inaceitável a omissão dos espíritas e, sobretudo, do movimento espírita sobre temas centrais do debate político.
É verdade que muitos espíritas, individualmente, têm louvável conduta e participam ativamente da vida política da nação, posicionando-se com respeito, racionalidade e ética.
Mas são iniciativas pessoais e não suprem o vácuo deixado pela omissão do movimento espírita.
Há, por certo, um elogiável cuidado para que se evite que pessoas usem instituições e a doutrina espírita como mote para auferir vantagens políticas e eleitorais.
Trata-se de um zelo fundado e razoável, mas que tem sido levado ao extremo, revelando-se inflexível dogma, que deve ser repensado urgentemente.
O termo política é polissêmico e aberto. Por isso, abriga várias interpretações e usos. Não obstante isso, pode-se afirmar que, de um modo geral e na sua acepção clássica, política é a arte de administrar o bem comum.
Neste sentido, não me parece razoável o movimento espírita ser omisso, sobretudo em um momento tão importante para o país e para humanidade, que enfrenta desafios globalizados e crises graves, cumulativas e convergentes, dentre as quais o crescente relativismo moral e o fundamentalismo materialista, político e religioso.
Como aceitar que um segmento tão importante da sociedade simplesmente cale, fique omisso e torne-se um indiferente espectador diante de tudo isso?
Como construir um mundo de regeneração se no curso da grande transição planetária preferimos o sofá para nos agasalharmos como ilustres espectadores de grandes debates públicos?
Primeiramente, convém lembrar a questão 766, do Livro dos Espíritos. Vejamos:

766 - A vida social está na  Natureza?
Certamente. Deus fez o homem para  viver em sociedade.

Portanto, a opção por isolar-se apenas no estudo da doutrina é um erro. Temos de sair da bolha “transcendental” e interagir com os desafios postos pela vida em sociedade.
Por outro lado, não basta que o espírita não faça o mal. É preciso agir proativamente. Ter atitude. Impõe-se participar efetivamente dos grandes desafios da humanidade. Jesus já dizia que quem com ele não somava, espalhava. Não fazer o bem, não participar das lutas por um mundo melhor, não se posicionar é ser conivente com o mal.
Kardec, no Cap. XVI, item 7, do Evangelho Segundo o Espiritismo, elucida: Com efeito, o homem tem por missão trabalhar pela melhoria do planeta.
A questão 573, do Livro dos Espíritos complementa o entendimento:

573. Em que consiste a missão dos  Espíritos encarnados?

“Em instruir os homens, em lhes  auxiliar o progresso; em lhes melhorar as instituições, por meios diretos e materiais (...)”

As questões 642 e 932 do Livro dos Espíritos reforçam minha convicção. É ler:

642. Para agradar a Deus e assegurar a sua posição futura, bastará que o homem não pratique o mal?

“Não; cumpre-lhe fazer o bem no limite de suas forças, porquanto responderá por todo mal que haja resultado de não haver praticado o bem.”

932. Por que, no mundo, tão amiúde, a influência dos maus sobrepuja a dos bons?

“Por fraqueza destes. Os maus são intrigantes e audaciosos, os bons são tímidos. Quando estes o quiserem, preponderarão.”


Estas questões do Livro dos Espíritos estão alinhadas com a clássica afirmação do líder negro Martin Luther King: “O que me assusta não são as ações e os gritos das pessoas más, mas a indiferença e o silêncio das pessoas boas.






[1] EMMANUEL; XAVIER, Chico. A Caminho da Luz: Brasília: FEB, 1996, p. 188, 194.
[2] O livro A Caminho da Luz é uma ótima fonte de pesquisa a respeito deste aspecto do tema.
[3]EMMANUEL; XAVIER, Chico. O Consolador. Brasilia:FEB, 1995, p.49.

A OMISSÃO DOS ESPÍRITAS - PARTE II


PARTE II
(Continuação)

Tenho consciência que as pessoas buscam o Espiritismo para os assuntos do Espírito.
Obviamente, sei que o objetivo do Espiritismo é a reforma moral.
E assim deve ser.
A questão é que não estou propondo nada que colida com esta visão e objetivo.
A proposta aqui defendida é sazonal, limitada a curtos períodos eleitorais e sem prejuízo das atividades ordinárias das instituições espíritas.
São, portanto, atividades e atuações que não são excludentes.
O que se deve ter presente é a gravidade deste momento de crise.
A omissão do movimento espírita revela-se grave na medida em que não se posiciona publicamente – e no momento político mais adequado, que é a eleição -sobre temas da maior importância para todo planeta. Vou citar apenas alguns dados que comprovam minha afirmação.
O que o movimento espírita tem a dizer sobre a crise ambiental? É a favor de quais medidas? O que suas instituições têm feito? Ou entende que não há crise ambiental?
Em outubro o Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas – IPCC divulgou novos dados sobre a crise ambiental.  O relatório toma por base milhares de pesquisas científicas. Contou com 309 autores, 436 colaboradores e 66 revisores de 70 países.
Dentre as previsões do IPCC destacam-se:
- As mudanças climáticas atingem mais profundamente pessoas em vulnerabilidade social ou geográfica. Isso agravará a crise humanitária de refugiados ambientais;
- A biodiversidade está sendo afetada. Espécies terrestres e marinhas estão alterando suas atividades sazonais, abrangência, padrões de migração e interação;
- São cada vez mais recorrentes e intensos os chamados eventos climáticos extremos, como secas e enchentes e cada vez mais fazem mais vítimas e afetam também os preços e a disponibilidade dos alimentos;
- Se as emissões de gases do efeito estufa continuarem subindo – como estão apesar das promessas -, até o fim do século XXI, o número de pessoas expostas a grandes enchentes será três vezes maior;
- Para cada aumento de um grau da temperatura média global no planeta, ocorrerá uma queda de 20% na disponibilidade de recursos hídricos para 7% da população mundial;
- Maiores riscos de mortes resultantes de ondas de calor;
- O nível dos oceanos está subindo devido ao maior calor absorvido e ao derretimento de geleiras e dos polos e muitas áreas habitadas serão gravemente afetadas.
- Os oceanos estão sofrendo um processo crescente de acidificação relacionado ao aumento da concentração de CO2;
- Maior exposição a doenças transmitidas pela água e por alimentos;
- O aquecimento global colocará em risco a produtividade pesqueira e os serviços ecossistêmicos dos oceanos;

Como se vê a crise ambiental exige um esforço de todos. O que se vê é que vários setores da sociedade estão se mobilizando para ajudar a reverter os estragos da crise ambiental. O que os espíritas têm a ofertar? Essa é uma pergunta que precisa ser respondida pelo movimento espírita. Só assim, este poderá posicionar-se.
Vejamos outro problema que merece posicionamento do movimento espírita. Refere-se aos Direitos Humanos, mais precisamente à luta contra o tráfico humano e o trabalho análogo à escravidão.
Um diagnóstico preliminar sobre o tráfico de pessoas no Brasil foi elaborado pela Secretaria Nacional de Justiça do Ministério da Justiça (SNJ/MJ), em parceria com o Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime (UNODC).
O estudo revela a existência de 475 vítimas entre os anos de 2005 e 2011. Desse total, 337 sofreram exploração sexual e 135 foram submetidas a trabalho escravo.
As mulheres são o principal alvo deste abominável crime, pois garantem melhor retorno financeiro para os traficantes através da exploração da prostituição, atividade responsável por 79% das vítimas do tráfico humano. O trabalho forçado, exercido por homens, mulheres e crianças, representa 18% do total.
Não custa lembrar que todos os meses no Brasil pessoas são libertadas de trabalhos degradantes, em condições análogas à escravidão.
Estamos falando de uma atividade rentável, que envolve uma rede internacional de criminosos, que movimenta cerca de 32 bilhões de dólares por ano, privando a vida de mais de 2,5 milhões de pessoas.
Aliás, não custa lembrar que Bezerra de Menezes – um dos maiores ícones do Espiritismo - teve uma sólida e bela trajetória política, com ampla atividade pública, com atuações a favor da proteção do meio ambiente, dos socialmente vulneráveis e notabilizando-se por sua luta contra a escravidão.
Por acaso, Bezerra estava errado em envolver-se com temas políticos?
É claro que não.
Gostemos ou não, é no palco político, no espaço público, que muitos temas relevantes à sociedade e à humanidade são debatidos. Ser omisso em nada ajuda.
Como ficar indiferente ao fenômeno de avanço da pedofilia, que é tema central de cerca de mil novos sites de pedofilia que são criados todos os meses no Brasil?
Estima-se que  76% dos pedófilos do mundo estão no Brasil.
Isso mesmo, na pátria coração do Evangelho.
Estudos indicam que 52%  desses sites tratam de crimes contra crianças com idades que variam de 9 a 13 anos.
E cerca de 12% deles  expõem  até crianças de zero a três meses.
O vinde a mim as criancinhas do Cristo foi substituído pelo vinde a mim dos pedófilos. E o que estamos fazendo?
Não dá pra ficar neutro, omisso.
Afinal, como anotou Dante Alighieri:
“No inferno os lugares mais quentes são reservados àqueles que escolheram a neutralidade em tempo de crise.”
O movimento espírita precisa se posicionar, unir forças e entrar na luta, pois esta é uma das que estamos perdendo.
Sua omissão abre espaço para que propostas e condutas condenáveis se alastrem. Por outro lado, tal posição deixa milhares de pessoas órfãs e desorientadas, pois gostariam de saber qual a posição do movimento espírita sobre uma miríade de temas relevantes.
Sem uma posição clara do movimento espírita vão buscar em outras fontes orientação, nem sempre adequada, o que condena milhares de pessoas a condutas e posicionamentos colidentes com o evangelho do Cristo.
Pragmaticamente, a omissão dos espíritas e, sobretudo, do movimento espírita em temas relevantes e centrais para sociedade e humanidade pode ter péssimas consequências em relação a propostas renovadoras e consistentes, como muito bem demonstrado no artigo “A Conspiração do Silêncio”, da educadora, escritora e coordenadora geral da Associação Brasileira de Pedagogia Espírita, Dora Incontri[1].
Esses, entre outros, são aspectos que devemos refletir com serenidade e maturidade, fugindo das verdades prontas e dos radicalismos.
Criar espaço nas instituições espíritas para o debate sobre temas centrais e relevantes para sociedade e humanidade é imprescindível.
Algumas instituições espíritas – como é o caso do Grupo Espírita Abrigo da Esperança – GEAE[2] - já tomaram a dianteira no experimento de construir uma nova postura do movimento espírita. Dentre outras coisas, abriram o espaço da instituição para receber candidatos e debater temas sensíveis.
Tenho minhas dúvidas se é o caso de abrir a casa espírita para receber candidatos. A princípio, penso que não.
Ao receber candidatos, as instituições espíritas correm um grande risco de serem usadas como palanques e de gerar dúvidas sobre apoio a certos candidatos. É preciso ter cautela. Talvez, no exercício desta cautela, a Federação Espírita de Pernambuco publicou nota restritiva ao uso do espaço de casas espíritas para o debate político[3].
Será esse o melhor caminho?
Sobre receber candidatos, faço uma ressalva.
Penso que seria interessante a Federação Espírita Brasileira – FEB organizar na próxima eleição presidencial uma série de eventos para oitiva dos candidatos à Presidência da República, que poderiam ser interpelados sobre suas posições sobre temas sensíveis ao movimento espírita.
Que mal faria esse debate?
É preciso ouvi-los e eles precisam nos ouvir.
O mais importante é que as instituições espíritas estejam abertas para debater os temas centrais do momento político, sob a ótica espírita.
Após debatidos os temas centrais, cada espírita examinará livremente o candidato que entende representar melhor o que foi debatido.
Por isso, impõe-se por na ordem do dia esta discussão. Para evitar distorções e o mau uso do espaço e da doutrina, bem como para também evitar que cada instituição espírita faça ensaios, testes e experimentos a seu jeito, convém que a Federação Espírita Brasileira – FEB abra espaço para o debate deste tema e oriente movimento espírita, de forma que a participação na vida política do país ocorra de forma organizada, crítica, cuidadosa e uniforme.
É verdade que sempre haverá um risco residual de distorções e de mau uso das instituições espíritas. Mas viver é correr riscos. E não há maior risco que a omissão, que o silêncio diante do avanço de projetos e teorias sombrias. A história é farta em condenações de posturas omissas de religiões e líderes religiosos em relação a assuntos graves como violação de direitos humanos, genocídios, etc.
Vamos flertar com este erro histórico?
Por fim, o último ponto que trago é um esboço, incompleto e apenas exemplificativo, sobre quais temas deveríamos nos posicionar.
Proponho que nas eleições, sobretudo, nas de âmbito nacional, que elegem o Presidente da República, os Governadores, os senadores e os deputados federais, o movimento espírita divulgue uma Carta de Proposições do Movimento Espírita.
Outros setores da sociedade já fazem isso com muito sucesso, colaborando para o amadurecimento e debate político.
Paralelamente a isso, que se programem palestras sobre conduta ética recomendada aos espíritas durante as eleições.
No tocante à Carta de Proposições do Movimento Espírita, o campo temático é vasto. Para fins de início de debates, seguem alguns temas sobre os quais o movimento espírita deveria se pronunciar. Vejamos:

1. Defender como prioridade a ética na política, com ênfase no diálogo respeitoso e plural, na revitalização moral das campanhas eleitorais  e no combate à corrupção;
2. Defesa do Estado Laico, com a separação do Estado e da religião, mas com respeito a todos as crenças religiosas e àqueles que não têm uma religião;
3.  Defesa da tolerância religiosa e cultural e combate a qualquer forma de fundamentalismo, perseguição, preconceito e discriminação;
4.  Defesa e respeito aos Direitos Humanos, com ênfase na proteção e respeito das minorias, no combate a qualquer forma de preconceito e discriminação. Repúdio à tortura, às penas degradantes e à pena de morte. Repúdio à violência contra crianças, mulheres e idosos e apoio ao combate ao tráfico humano e ao trabalho degradante e análogo à escravidão;
5. Reforçar o pacto pela vida, com ênfase na posição contra a eutanásia, na ampliação de políticas públicas de prevenção ao suicídio, combate às drogas e contra o aborto, neste caso, defendendo políticas públicas preventivas e de acolhimento fraterno, assistencial e psicológico às mulheres;
6.  Defesa do meio ambiente e do interesse das futuras gerações, com ênfase no fortalecimento do mercado ético, na ampliação da matriz energética limpa e renovável, na economia sustentável e na ampliação de políticas públicas preventivas para desastres ambientais;
7. Priorização e ampla reforma da educação no país, com destaque para a formação integral do ser humano e com espaço para o ensino religioso de caráter plural e multidisciplinar;
8. Apoio às políticas de inclusão e proteção social, com ênfase no fortalecimento de mecanismos que impeçam a dependência e o uso eleitoreiro de tais benefícios;
9.  Combate à criminalidade com políticas públicas de caráter preventivo, sobretudo com criação de oportunidades e vias de inclusão social e de resocialização;
10.        Atuação geopolítica fundada no amplo diálogo, na diversidade, no respeito ao meio ambiente, aos direitos humanos e na cultura da paz.

Naturalmente, tais propostas são apenas sugestões incompletas e imperfeitas. Impõe-se melhora-las e acrescentar outras.
Não tenho a pretensão de falar pelo movimento espírita e tampouco de pautar suas posições e prioridades. Longe disso. Este artigo, como disse no início, é uma crítica saudável e com a melhor das intenções. No fundo é uma declaração de amor. E quando se ama, quer-se sempre o melhor.
Ele visa propor um amplo debate sobre um tema que ainda é um tabu, bem como estimular uma mudança de postura do movimento espírita.
E se isso acontecer, já terá valido a pena.





[2] Disponível em: http://www.geae.org.br/carta-aberta-eleicoes-2014/ Acesso em 09.11.2014.